Será que nosso universo é o espelho de outro?
Essa teoria pode parecer maluca, mas existem algumas boas
razões para os físicos acreditarem nela. Além disso, como um sinal misterioso detetado
na Antártica há pouco tempo demonstrou, é possível até mesmo prová-la.
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Photo//Hypeesscience |
Revolvido o mistério da expansão do universo
O Modelo Lambda-CDM
A hipótese do universo-espelho vem de um artigo escrito por
Latham Boyle, do Instituto Perimeter de Física Teórica (Canadá), e seus
colegas, publicado em 2018 na revista Physical Review Letters. Neste artigo, os
físicos trabalharam em cima de uma explicação dominante sobre a origem do
universo, o Modelo Lambda-CDM (em inglês, “Lambda-Cold Dark Matter” ou
“lambda-matéria escura fria”).
Esse modelo utiliza dois conceitos-chave, energia escura e
matéria escura. No caso, uma energia escura desconhecida é o que causa a
expansão do universo e, se “rebobinarmos” essa expansão até o seu início, o
universo todo ocupa um ponto único no espaço (o Big Bang). E esse universo é
composto principalmente por uma matéria escura invisível, que afeta
gravitacionalmente a matéria regular.
O Modelo Lambda-CDM funciona muito bem para ilustrar o
cosmos, mas possui algumas falhas. Por exemplo, medidas da expansão do universo
nem sempre se alinham. Além disso, a teoria não explica por que a matéria
existe, uma vez que ela deveria se aniquilar quando em contato com a
antimatéria.
A hipótese do universo-espelho
Para tentar corrigir as falhas desse modelo, Boyle e seus
colegas imaginaram um universo que vai mais longe no tempo do que o Big Bang.
Esse segundo universo seria como o nosso, mas estaria na outra ponta desse
ponto único no espaço.
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Imagem// Meghan McCarter |
Para entender isso, imagine o universo de hoje como um
círculo chato um pouco maior do que o de ontem, e assim por diante. Empilhe
todos esses círculos até o Big Bang e acabaria com um cone:
Os atuais telescópios podem pesquisar muito longe no espaço
(e portanto no tempo), mas não conseguem ver o momento do Big Bang. O ponto mais
distante alcançado nesse “cone” é o Fundo Cósmico de Microondas (CMB), que se
formou 370.000 anos após o Big Bang.
Como as observações astronômicas param no CMB e nenhum
modelo cosmológico vai mais longe do que o Big Bang, a equipa de Boyle decidiu
cruzar essa linha.
De acordo com o físico, ao prestar atenção no universo muito
próximo ao Big Bang, percebe-se que ele é muito mais simples do que a maioria
das singularidades que surgem na teoria da gravidade de Einstein, por exemplo.
E ele pode ser extrapolado, estendido, como um segundo cone ou segundo universo
afastando-se, no tempo, para longe do Big Bang.
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Imagem// Meghan McCarter |
Novo mapa incrível do universo de raios-X
Espelho significa
igualzinho
Enquanto um segundo universo pode parecer exagero, Boyle diz
que ele seria “a extensão mais simples e
natural das equações que descrevem o universo como o vemos”. Do mesmo modo
que o próprio Big Bang, o universo dentro deste “segundo cone” está muito longe
no espaço-tempo para que possamos vê-lo.
E, enquanto do nosso quadro de referência, o tempo pode
parecer retroceder nele, os seres desse universo (se houver algum) ainda veriam
a causa surgir antes do efeito, assim como fazemos no nosso.
O tempo vai para longe do Big Bang nesse universo,
exatamente como no nosso, ou seja, não voltaria “para trás” da maneira como
poderíamos imaginar.
Por que faz sentido
Não temos evidências de que esse universo-espelho exista,
mas ele faz sentido. Por exemplo, ele traz uma simetria extra que não vemos
quando observamos apenas o cone superior. E tal simetria poderia “consertar”
falhas numa teoria que vêm incomodando os físicos há anos.
A teoria da “simetria CPT”, ou simetria de carga, paridade e
tempo, afirma que se mudarmos a carga, paridade ou direção de uma partícula,
ela ainda deve se comportar da mesma maneira e obedecer às mesmas leis como
fazia antes.
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Imagem// Meghan McCarter |
Essa simetria parecia inviolável até 1956, quando a física
Chien-Shiun Wu da Universidade de Columbia (EUA) liderou uma experiencia que
estabeleceu que algumas partículas podiam quebrar a simetria de carga. Outros
estudos descobriram novas imperfeições, embora nenhuma partícula que quebre
todos os três elementos da simetria tenha sido encontrada até hoje.
De maneira geral, no entanto, o próprio Modelo Lambda-CDM
carece de uma simetria CPT clara. Já o modelo de Boyle, ao adicionar um segundo
universo, ou segundo cone ao espaço-tempo, preserva essa simetria
perfeitamente.
Quebras na simetria perfeita do universo podem ser janelas
para uma física completamente nova
Explicação simples
para a matéria escura
Provavelmente sabe que os físicos tentam encontrar a matéria
escura há muito tempo, sem sucesso. Uma das consequências mais interessantes do
universo-espelho simétrico de Boyle é resolver esse problema.
Uma teoria popular dita que tal matéria invisível seria um
quarto tipo de neutrino, chamado de neutrino estéril ou inerte. Hoje,
conhecemos apenas três tipos de neutrinos, o elétron,o múon e o tau, e todos são
“canhotos”. Isso significa que voam por aí sem um parceiro destro, violando a
simetria. O Modelo Padrão da Física pressupõe que, diferentemente de outras
partículas, os neutrinos não têm pares opostos. A simetria CPT discorda, é
claro.
No cosmos de Boyle, no entanto, existem três neutrinos
destros para acompanhar cada neutrino canhoto, só que eles agem um pouco
diferente. Não ficam juntos como os quarks, por exemplo. Dois deles teriam há
muito se perdido no espaço-tempo, decaindo na nossa visão do universo
primitivo. Um terceiro teria ficado por aqui, como consequência das equações
que governam o início dos tempos.
De acordo com Boyle, não está claro com qual dos três
neutrinos canhotos conhecidos esse neutrino destro sobrevivente faria par, mas
ele teria uma assinatura de energia específica, 480 picoelétron-volts (PeV).
Por outras palavras, tal neutrino de 480 PeV pode ser a tal
matéria escura que tanto procuramos no universo.
Cientistas encontram evidencias da existência de um universo paralelo
Sinal bizarro na
Antártica
Quatro anos atrás, um detector de partículas pertencente ao
projeto ANITA detectou algo estranho, sinais de partículas de alta energia que
pareciam disparar diretamente do gelo antártico.
Mas estranho porquê? Porque partículas como essa não deveriam
existir. Nenhuma das conhecidas pelo Modelo Padrão deveria ter sido capaz de
andar por toda a Terra e explodir na Antártica a energias tão altas.
Em junho de 2020, um artigo divulgado através do banco de
dados arXiv (o que não corresponde a uma publicação científica revisada por
pares) levantou uma hipótese de que o ANITA poderia ter detetado neutrinos
estéreis, uma vez que as partículas estranhas tinham o mesmo valor estimado de
480 PeV.
A ideia é boa, mas essencialmente é um tiro no escuro. Se os
cientistas que a propuseram acertarem, vai ser sorte, e é mais provável que
errem.
Por exemplo, o neutrino estéril não pode explicar totalmente
a deteção bizarra do ANITA, uma vez que os modelos mostram que partículas
candidatas à matéria escura como essa cairiam no centro da Terra depois de
percorrem o nosso planeta, e não na superfície e muito menos na Antártica.
“Foi um conceito
interessante”, disse John Learned, astrofísico da Universidade do Havaí
(EUA) e um dos autores desse artigo. No entanto, nem mesmo ele está 100%
convencido da hipótese. “Entre o pessoal
da cosmologia, há uma ideia de que pode usar uma ‘fada dos dentes’ uma vez no
seu modelo, mas duas vezes simplesmente não é credível. E acho que precisávamos
da fada dos dentes duas ou três vezes para fazer esta hipótese funcionar”,
explicou.
Boyle concorda que somente os números não são suficientes.
Mas ele ainda está confiante de que a ideia subjacente, de um universo
simétrico, é sólida. “Meu palpite pessoal
é que, correta ou não, [essa teoria] está no caminho certo”, concluiu.
Será que existe mesmo um segundo universo refletido?
Astrónomos detectam a maior explosão da história do Universo
Referencia//LiveScience
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